(Bem-vinda!)
Depois da tempestade de areia já nem pensava mais nisso. Em pé, olhos calmos fitando o horizonte através do corpo quebrado e ressequido, dividida entre o entender e o se deixar sentir, num estado puro de tanto-faz-o-que-vier-o-pior-de-tudo-eu-já-passei.
Parte do deserto.
Lady of Storm do lado avesso.
Talvez por isso não vi os sinais e não acreditei muito quando o cheiro invadiu entradas e, denso, me achou na multidão. Nem tentei espiar pra conferir e continuei no programado, bem aproveitando a temperatura pré-fabricada de ambientes artificiais antes de encarar mais uma vez a secura do começo de noite.
Então o moço viu e me mostrou: 'tá chovendo!'
Riu quando eu contei que ia embora dançando na chuva mas bem sei que era a vontade secreta de muita gente na cidade, tal comoção geral se espalhou nos rostos agradecidos.
(No meu pensar, inclusive, me vi foi bem com a língua de fora tentando apagar o fogo de dentro.)
Mas como se completa o que já estava completo? Ter pressa e ao mesmo tempo adiar o agir só pra sonhar um pouco mais com como seria o momento assim que... então lembrei da lição do agora, fisguei a vontade e segurei o quando pela mão. Saímos um só.
Na segunda pisada fora, tiozinho de butuca chega fluente no dialeto dos que tudo vendem oferecendo guarda-chuva, desde quando esperava prevenido?, respondo não e ele entende, rimos os dois. Na verdade todo o mundo está rindo, vontades lavadas.
Nessa altura o pó já assentou nos caminhos recém brilhantes, mas os 3 pingos que caiam aqui e ali evaporavam antes de tocar na pele. Ando mais um trecho, frustrada, sensação vaga de ter caído na pegadinha do malandro.
Então chego na outra asa do pássaro e a festa vira verdade. Tanta alegria que nem me preocupo com as maquininhas e livros que carrego, o universo cuida. De tão agradecida da água, que lavou o sangue coagulado do dragão ferido, que saí do pensar. Só fui, inteira.
E estou. Noite feliz de jardineira: depois de 103 dias sem chover a água desce justamente depois de terminados os novos arranjos no paisagismo interior. Bom sinal, bom sinal. Cobras de luz no céu.